Rumo ao fim da quimioterapia no tratamento d…
As leucemias agudas foram algumas das primeiras doenças oncológicas a se beneficiarem da quimioterapia. Na década de 1940, surgiram os primeiros relatos de remissão induzida por medicamentos, detalhados no livro O Imperador de Todos os Males (Companhia das Letras), de Siddhartha Mukherjee.
Até então, a leucemia era fatal, mas estudos pioneiros em Boston e Nova York, como o uso da aminopterina por Sidney Farber no centro conhecido hoje como o Dana-Farber Cancer Institute, em Boston, demonstraram remissões temporárias, evidenciando a necessidade de combinar mais medicamentos.
Essas descobertas levaram ao desenvolvimento da poliquimioterapia, tornando as leucemias um paradigma dessa abordagem e um marco na oncologia.
Tipos de leucemias
Nem todas as leucemias são iguais. A principal distinção é entre leucemias agudas, que apresentam rápida proliferação de células jovens (blastos), e leucemias crônicas, caracterizadas por um aumento lento de células adultas (maduras).
A evolução clínica também difere: enquanto a doença aguda progride rapidamente e causa sintomas em dias ou semanas, a crônica pode ser assintomática e diagnosticada por alterações no hemograma, com evolução ao longo de meses ou anos.
Outro fator essencial é a linhagem celular envolvida, que pode ser mieloide ou linfoide. As células mieloides originam neutrófilos, glóbulos vermelhos e plaquetas, enquanto as linfoides dão origem aos linfócitos.
Assim, as leucemias são classificadas em quatro tipos principais: leucemia linfoblástica aguda (LLA, mais comum em crianças), leucemia mieloide aguda (LMA, mais comum em adultos), leucemia linfocítica crônica (LLC, mais comum em pacientes mais idosos) e leucemia mieloide crônica (LMC, mais comum em adultos).
A diferenciação é feita por exames especializados, como a citometria de fluxo.
A leucemia não é contagiosa e, muito raramente, é hereditária. Como o prognóstico das leucemias agudas e crônicas é muito diferente, o uso do termo “leucemia” nas formas crônicas pode ser inadequado, gerando apreensão desnecessária em muitos pacientes.
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Os principais sintomas
Os sinais da leucemia variam conforme o tipo (linfocítica ou mieloide, aguda ou crônica) e podem ser inespecíficos, semelhantes aos de uma gripe.
Na leucemia aguda, os sintomas surgem rapidamente e incluem febre persistente, infecções sem causa aparente, sangramentos espontâneos, palidez, sudorese, fadiga, dor óssea e aumento dos linfonodos (“ínguas”), fígado ou baço.
Na leucemia crônica, a progressão é mais lenta, com sintomas como infecções recorrentes, sangramento, fadiga, perda de peso, sudorese e aumento do baço. Vale lembrar que muitos pacientes com leucemia crônica são diagnosticados incidentalmente, sem apresentar sintomas.
Tratamento
O tratamento da leucemia varia conforme o tipo e pode incluir:
A indicação do TMO depende de vários fatores, sendo mais comum em leucemias agudas, de acordo com o subtipo da doença e a resposta ao tratamento inicial.
O doador ideal geralmente é um irmão 100% compatível, mas, na ausência de um doador familiar, a medula pode ser obtida de um doador não aparentado cadastrado em um registro de medula óssea, desde que também seja 100% compatível. Outra possibilidade é o transplante haploidêntico, em que o doador é um irmão, pai ou filho com 50% de compatibilidade.
Nas leucemias crônicas, tanto o TMO quanto a quimioterapia deixaram de ser utilizados como tratamento de primeira linha. Na leucemia mieloide crônica (LMC), a abordagem é baseada em inibidores de tirosina quinase, enquanto na leucemia linfocítica crônica (LLC), o tratamento pode incluir medicações orais combinadas ou não à imunoterapia.
Quimioterapia com os dias contados nas leucemias?
O fato de a quimioterapia não ser mais utilizada no tratamento das leucemias crônicas representa um grande avanço.
Nas leucemias agudas, até pouco tempo atrás, essa possibilidade era inimaginável. No entanto, esse cenário vem mudando rapidamente. Atualmente, já se vislumbra a possibilidade de regimes sem quimioterapia para alguns tipos de leucemias agudas.
Em um subtipo específico e mais raro de LMA, a leucemia promielocítica aguda, esse modelo de tratamento já é uma realidade consolidada. Além disso, para outros tipos de LMA e LLA, abordagens não quimioterápicas estão se tornando uma alternativa viável, com resultados iguais ou superiores à quimioterapia e menor toxicidade.
Essas novas estratégias incluem imunoterapia, terapias-alvo, drogas que induzem a morte da célula leucêmica, terapia gênica e epigenética, além da terapia celular.
O transplante de medula óssea ainda é uma modalidade amplamente utilizada, mas, na leucemia linfoblástica aguda, por exemplo, vem perdendo espaço para as terapias celulares.
Dessa forma, as leucemias, que por décadas foram o principal símbolo do tratamento quimioterápico, caminham para um futuro no qual a quimioterapia poderá deixar de ser a base do tratamento.
*Phillip Scheinberg é hematologista
(Este texto foi produzido em uma parceria exclusiva entre VEJA SAÚDE e Brazil Health)