O boom do triatlo: benefícios da modalidade…

Do Lago Maggiore, na fronteira entre a Suíça e a Itália, anualmente partem cerca de 200 atletas que iniciam uma jornada de 226 km de nado, ciclismo e corrida atravessando os planaltos e os Alpes Suíços. É o trajeto do Swissman Xtreme Triathlon, uma das principais competições de triatlo extremo do mundo.

O educador físico Lucas Benjamin, de 41 anos, está no seleto grupo de atletas que conseguiram concluir o desafio em 2022, na primeira edição realizada após a pandemia. Junto à sua equipe, foram 15 horas e 25 minutos de suor e superação em meio a paisagens de tirar o fôlego.

Ao cruzar a linha de chegada, Benjamin se tornou o primeiro brasileiro a encarar as três principais provas do gênero na Europa — em 2016, o paulista participou da Celtman, na Escócia, e, em 2018, da competição norueguesa Norseman.

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Ao longo de duas décadas dedicadas ao esporte como atleta e treinador, o esportista construiu um currículo de deixar qualquer um boquiaberto, cheio de conquistas e até recordes sul-americanos. Mas o início, claro, não começou no pódio.

“O primeiro contato que tive com o triatlo foi em 2004 através de um amigo e aluno meu, que já praticava o esporte e me inscreveu para participar de uma prova em Santos”, lembra Benjamin. No litoral, o educador físico estreou logo na modalidade olímpica: 1,5 km de nado, 40 km de bike e 10 km de corrida.

“Comecei a prova bem, dando tudo de mim e à frente do meu colega. Mas, quando chegou a hora de correr, perdi o fôlego e fui ultrapassado. Eu quebrei”, recorda. No “triatlês”, quebrar significa que a estratégia falhou.

Você pode ter subestimado a prova, não ter se preparado adequadamente e, então, o inevitável acontece: bate aquela falta de energia, lá vem um boicote ao ritmo e você pode até sair do páreo. Mas a estreia não tão bem-sucedida não parou Benjamin.

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Na verdade, a derrota foi um estímulo para que ele trabalhasse sua resistência e mergulhasse no mundo do endurance, os esportes de longa duração que exigem, entre outras coisas, fôlego e constância.

O desejo por novos desafios foi o que também levou a cirurgiã Luciana Haddad, presidente da Associação Brasileira de Transplantes de Órgãos, a se apaixonar pelo esporte.

“Quando comecei a treinar, fazia apenas corrida, em busca de uma melhor qualidade de vida, mas fui atraída pelo dinamismo e pela competitividade que o triatlo proporciona”, diz a médica. É o que a maioria dos esportistas procura.

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Quem é triatleta

De acordo com uma pesquisa da Ticket Sports, a principal motivação dos competidores de triatlo é a batalha consigo mesmo, seguida pela busca por qualidade de vida e, depois, pelo ganho de saúde. O mesmo levantamento mostra que o interesse pelo esporte decolou nos últimos anos.

Dos 782 triatletas amadores e profissionais ouvidos, 62% haviam começado a praticar fazia menos de três anos — uma febre pós-pandemia — e menos de 14% eram adeptos havia mais de oito anos.

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De fato, o apetite pelo triatlo cresce pelas trilhas, estradas, academias… e na internet. “Hoje em dia você tem que correr para se inscrever nas competições antes que as vagas se esgotem. A competição começa aí”, conta o fisiologista do esporte Gerson Leite, professor de pós-graduação da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).

Para o pesquisador, treinador e atleta, que acompanha e pratica a modalidade há cerca de 20 anos, é uma alegria ver a demanda lá em cima. A porta de entrada, como em outras situações, é o buscador do Google.

Segundo análise da ferramenta digital Semrush, a procura pelo termo cresceu 82% pelo Brasil em 2024 quando comparada ao ano anterior. É um boom entre todas as modalidades!

E não é preciso ser um atleta de ponta com paixão por provas extremas, como Lucas Benjamin, para tirar proveito dessa aventura para a mente e o corpo.

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Modalidades alternativas popularizam o triatlo (OSTILL/Getty Images)
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A origem do esporte

A variedade de exercícios físicos em um só esporte é também um atrativo a quem quer testar seus limites. Foi assim que o triatlo nasceu na década de 1970.

Depois de curtirem as férias, os atletas do San Diego Track Club, um time de corrida da Califórnia, nos Estados Unidos, tinham que provar que continuavam em forma para a temporada de competições seguinte.

Então, os treinadores da equipe criaram uma série de desafios para testá-los. Eles deviam nadar 500 metros, pedalar por 12 km e, por fim, correr 5 km — de uma vez só.

Os atletas levaram a avaliação na esportiva e pegaram gosto pela combinação. O trio de natação, ciclismo e corrida se popularizou pelos EUA e, em pouco tempo, ganhou fãs em todo o mundo.

Chegou ao Brasil em 1981 e, dois anos depois, o Rio de Janeiro se tornou o cenário da primeira competição do esporte no país. Atualmente, a União Internacional de Triatlo (ITU, na sigla em inglês) estima que haja mais de 1 milhão de praticantes ao redor do mundo.

No Brasil, são cerca de 25 mil, segundo a Confederação Brasileira de Triathlon (CBTri).

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Triatlo nas Olimpíadas

Outro motivo que deu um gás para o crescimento da modalidade é o fato de ele ser um esporte olímpico. O triatlo estreou nos Jogos de Sydney, no ano 2000, quando o individual feminino foi vencido pela suíça Brigitte McMahon e o masculino, pelo canadense Simon Whitfield.

Da primeira temporada na Austrália até a Olimpíada de Paris, o foco no pódio só se intensificou. “O desempenho dos atletas brasileiros tem se superado a cada edição”, avalia Leite, que trabalha com várias estrelas do esporte.

Nos Jogos de 2024, a delegação brasileira na França contou com quatro triatletas: Manoel Messias, Vittoria Lopes, Djenyfer Arnold e Miguel Hidalgo — que ficou em décimo lugar na classificação masculina, a melhor posição da história do país.

Além disso, o quarteto foi responsável por levar o Brasil à competição de revezamento misto pela primeira vez. Alcançaram a oitava colocação, com 1 hora, 27 minutos e 23 segundos de prova — a menos de dois minutos e meio de conquistar uma medalha.

Provando que é democrático, o triatlo também está presente nos Jogos Paralímpicos desde 2016, e, na última edição, o paratriatleta Ronan Cordeiro conquistou o segundo lugar da competição, levando a prata para casa.

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O esportista, que nasceu com uma malformação na mão esquerda, concluiu o trajeto de sua categoria em 59 minutos e 1 segundo. Foi o primeiro pódio do Brasil desde a inclusão do esporte nas Olimpíadas e Paralimpíadas.

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Para todos os gostos

Outra característica da modalidade é que ela comporta, entre treinos e competições, diversas variações, podendo abrigar dos estreantes aos loucos por desafios sobre-humanos.

Se você tem um bom condicionamento físico, quer dar uma chance para o esporte e se botar à prova, o triatlo sprint (também chamado de short) é uma bela pedida. São 750 metros de natação, 20 km de ciclismo e 5 km de corrida. Parece missão impossível?

Prove o supersprint, cujos trajetos visam à metade disso: 350 metros de nado, 10 km de bike e, finalmente, 2,5 km correndo.
Quem pretende avançar para o nível seguinte deve apostar no triatlo olímpico (ou standard), que exige o dobro do trajeto do sprint. Depois disso, o céu é o limite para os triatletas.

Você pode se candidatar a um meio-Ironman, com uma meta de 1,9 km de natação, 90 km de ciclismo e 21 km de corrida. Ou talvez encarar 3,8 km nas águas, 180 km pedalando e, para fechar, uma maratona de 42 km. Este é o Ironman! No Brasil, Florianópolis e Fortaleza são as principais capitais que oferecem competições na modalidade.

Ah, não está satisfeito? Tente o Ultraman, uma competição de proporções absurdas, feita em três dias. No primeiro, o participante nada 10 km em mar aberto e pedala por 145 km. No segundo, são mais 276 km em cima da bike. E, no terceiro, tem que ter pique para duas maratonas: 84,4 km gastando sola.

Vai encarar?

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Dedicação desde o princípio

A esta altura, você deve estar se perguntando: como um ser humano aguenta tudo isso? Do supersprint ao Ultraman, o segredo não é outro senão comprometimento com os treinos e autoconhecimento. O triatlo exige, de cara, dedicação, essencialmente porque são três esportes em um.

Segundo a pesquisa do Ticket Sports, seis a cada dez praticantes passam de cinco a 12 horas por semana treinando. Outros 17% batem essa marca.

“Conciliar tudo isso com a agenda profissional e pessoal é um desafio. No último ano, não consegui manter os treinos, mas pretendo voltar”, relata Luciana, que já concluiu dezenas de provas no Brasil e mundo afora, especialmente de Ironman.

Também exige um investimento financeiro: 40% dos adeptos gastam de 100 a 500 reais por mês com a prática e 33% desembolsam de 500 a mil reais. Mas é possível treinar com o que se tem em casa.

“Você não precisa comprar o tênis ou a bike mais caros do mercado para dar uma chance ao esporte. Tente com seus próprios equipamentos e avance conforme o corpo, o tempo e os recursos permitirem”, aconselha Leite.

Para aqueles que querem evoluir ou têm condições médicas que cobram algum cuidado maior, um bom investimento é contratar uma assessoria especializada.

“Cada pessoa tem objetivos e limites diferentes, e, para traçar um bom plano de treino, é necessário ouvir atentamente cada demanda e fazer avaliações cardiorrespiratórias, ortopédicas, nutricionais…”, lista Benjamin, que fundou a própria consultoria, a Kaha Multisport, em Santo André, na região metropolitana de São Paulo.

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Saiba como prevenir lesões ao praticar triatlo (OSTILL/Getty Images)

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Cuidados com a saúde

Quanto mais informações você tiver sobre seus pontos fortes e fracos, mais assertivo e seguro será o treino — e mais benefícios à saúde irá colher. Vantagens não faltam nessa combinação de natação, ciclismo e corrida.

“A principal delas é a melhora nas funções cardiovasculares e respiratórias, algo que impacta a qualidade de vida e a longevidade”, resume a médica do esporte Carla Tavares, coordenadora de medicina do esporte e exercício da Rede Mater Dei de Saúde, em Minas Gerais.

Esse ganho se dá porque as três atividades que compõem o esporte são aeróbicas, ou seja, promovem uma melhor captação e uso do oxigênio pelos nossos músculos, inclusive do coração. “Com essas adaptações, diminuímos a frequência cardíaca e a pressão arterial, tornando o corpo e o sistema cardiovascular mais eficientes.”

Além da atividade aeróbica, também é necessário que o indivíduo pratique exercícios de fortalecimento; afinal, são eles que irão ajudar a segurar o tranco e a prevenir lesões durante a prática. Ainda, para traçar melhor a evolução de cada atleta, pode fazer diferença conhecer a própria genética.

“Ela influencia tudo, desde a probabilidade de cada um para se adaptar a um tipo de treino até a velocidade com a qual os resultados vão aparecer”, exemplifica Leite. As particularidades individuais repercutem inclusive na motivação para seguir em frente e se aprimorar.

Muitos desistem pela falta de uma bússola, especialmente se o desafio ganha escala.

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Outros fatores que pesam nos bons resultados nos treinos e nas competições, mas muitas vezes são negligenciados, são o descanso e a alimentação.

“Não adianta treinar muito se não tiver uma recuperação adequada, porque as adaptações do organismo, tanto do ponto de vista muscular quanto cardiorrespiratório, só vão acontecer quando a gente consegue se restabelecer fisiologicamente”, ressalta Carla.

Por fim, a alimentação é o que provê o combustível para o atleta, amador ou profissional. “E ela ganha ainda mais relevância quando praticamos exercícios mais prolongados ou mais intensos”, ressalta o nutricionista Murilo Dáttilo, membro da Associação Brasileira de Nutrição Esportiva.

Não dá para negar: o triatlo exige bastante energia para equilibrar os pratinhos dentro e fora das competições. Mas tudo vale a pena para quem não abre mão de superar desafios.

12 passos para começar a praticar

Equilíbrio entre treinos e o bem-estar é o segredo

1. Na intensidade certa
Treine na medida e no tempo que o seu corpo é capaz de se fortalecer e se recuperar. Exigir demais dele pode apenas expor a um maior risco de lesão.

2. Encaixe na rotina
Por ser um esporte três em um, é preciso ter um bom espaço na agenda para conseguir se dedicar ao triatlo. A preparação também não se resume a treino.

3. Tempo para descanso
Sim, você também terá que reservar boas horas para dormir e se alimentar adequadamente. Afinal, sua performance depende disso.

4. Encontre um grupo
Encare esse novo hobby como uma oportunidade de se conectar com pessoas que têm interesses afins e podem estimulá-lo
a continuar no jogo.

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5. Alimente-se bem
Má nutrição pode atrapalhar o desempenho no treino e em provas, provocando náuseas, vômito e diarreia. Se possível, procure um nutricionista.

6. Sem álcool e fumo
Bebidas alcoólicas provocam desidratação e estão associadas a problemas cardiovasculares no longo prazo. O cigarro também sabota o fôlego.

7. O básico funciona
Para praticar triatlo, você só precisa de roupas de natação, uma bicicleta e seus equipamentos de proteção, além de um tênis confortável.

8. Não gaste à toa
Não se assuste com os preços de equipamentos de elite: você provavelmente não precisará deles. A menos que avance, dá pra suar sem dívidas.

9. Variações do esporte
Há muitas formas diferentes de explorar o triatlo. De trajetos curtos a sobre-humanos. Para adultos e crianças. Adapte ao seu gosto e à sua capacidade.

10. Assessoria esportiva
Quer evoluir? Considere contratar profissionais para tornar seus treinos mais proveitosos, destacar-se nas provas e reconhecer seus pontos fortes e fracos.

11. Curta viagens
Há competições em todas as regiões do Brasil e em outros continentes. Aproveite para curtir novas paisagens enquanto nada, pedala e corre.

12. Divirta-se
O triatlo é um esporte dinâmico, ideal para quem quer ficar longe da monotonia. Dentro ou fora do pódio, a modalidade pode virar uma paixão.

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